Quando procura se definir a Doença Mental, encontram-se diversos
obstáculos, dificuldades e uma certa controvérsia a respeito dessa questão.
Muitos estudiosos procuraram estabelecer um conceito do que é um
indivíduo psicótico, procurando diferenciá-lo do indivíduo com comportamento
normal e neurótico.
COLEMAN (1973) considera o comportamento anormal como resultado
de uma grave descompensação de personalidade, refletindo uma deformação da
realidade e a perda de contato com esta.
Se, ao tentar definir a Doença Mental encontrar uma certa
dificuldade, ao estabelecer a sua etiologia, os obstáculos e controvérsias são
mais atenuantes.
Porém, os fatores etiológicos atualmente apresentam mais
facilidades de serem comprovados amiúde, principalmente, quando são fatores de
origem organocerebrais.
Alguns fatores considerados relevantes, porém não diretamente
causais, para o estabelecimento de comportamento anormal no indivíduo são:
}
a lesão cerebral;
}
a hereditariedade;
}
a situação de stress;
}
os traumas infantis e os problemas na formação
psíquica do indivíduo (processo de identificação).
De acordo com a causa da origem da Doença Mental pode-se
estabelecer uma classificação para a mesma. Quando a perturbação psicótica apresenta uma
patologia orgânica identificada no sistema nervoso central (SNC), ela é
denominada psicose orgânica. Quando não
se descobre uma base orgânica específica para a perturbação, pode-se
denominá-la psicose funcional, onde se consideram duas classes de perturbações,
as reações esquizofrênicas e as reações afetivas. (MARTIN, 1977)
“Define-se a Doença Mental com os mesmos métodos conceituais que
a doença orgânica, se isolam e se reúnem sintomas psicológicos como os sintomas
fisiológicos, é porque antes de tudo, se considera a doença, mental ou
orgânica, como uma essência natural manifestada por sintomas específicos”.
(FOUCALT, 1968, p. 13).
Os sintomas apresentados pelo psicótico diferenciam-se do
neurótico, à medida que existem graus crescentes de desorganização ou
descompensação. A perturbação psicótica
apresenta um elevado grau de descompensação da personalidade, ocorrendo a
inviabilidade de um contato com a realidade e uma problemática nas relações
interpessoais.
Freqüentemente, os psicóticos apresentam determinados sintomas,
como:
}
excitação;
}
deformação perceptual;
}
perturbação motora;
}
hostilidade;
}
retardamento nos pensamentos e apatia;
}
intropunitividade angustiada;
}
projeção paranóica;
}
desorientação;
}
desorganização conceitual;
}
ausência de culpa;
}
impulsividade;
}
busca de estímulo;
}
baixa tolerância à frustração;
}
incapacidade para manter relações.
Partindo-se da premissa que a Doença Mental é vista como uma
ruptura psico-orgânica, os tratamentos existentes baseiam-se, fundamentalmente,
numa intervenção química, física e na psicoterapia.
A Psicofarmacoterapia visa o tratamento para distúrbios
psicóticos agudos e para reabilitação de doentes crônicos.
No início da década de 50, o cirurgião LABORIT apud SILVEIRA (2001) descobriu uma
substância próxima dos antialérgicos que levava a uma “desconexão cerebral”,
produzindo uma “hibernação artificial”.
Essa substância foi denominada “Chlorpromazina”. Porém, o grande inconveniente da
quimioterapia é o efeito colateral dos medicamentos.
Os psicofármacos freqüentemente utilizados são:
}
hipnóticos e sedativos;
}
tranqüilizantes ou ansiolíticos;
}
neurolépticos ou antipsicóticos;
}
timolépticos ou antidepressivos;
}
psicoestimulantes ou psicanalépticos;
}
psicodislépticos ou alucinógenos.
Outra terapia utilizada e indicada para melancolias e catatonias
é a Terapia do Eletrochoque. Em 1928,
CERLETTI apud SILVEIRA (2001)
procurou uma forma de conseguir que os esquizofrênicos tivessem crises
epilépticas. Ao visitar um matadouro de
porcos, em Roma, verificou que antes de serem abatidos, estes eram submetidos a
choque e que logo após apresentavam crises convulsivas.
CERLETTI, então, concluiu que poderia provocar uma convulsão no
ser humano por corrente transcerebral, sem matá-lo. Surge, assim, a Terapia do Eletrochoque que
é a indução de um ataque convulsivo epiléptico a partir de uma descarga
elétrica.
Supunha-se que através do eletrochoque podia-se estimular o
transmissor do hipotálamo, possibilitando uma ajuda ao tratamento de pacientes que
são refratários a medicamentos antidepressivos e que apresentam perigo de vida,
como por exemplo, a tentativa de suicídio.
Outro tratamento existente é o Choque Hipoglicêmico ou Coma
Insulínico (Método de SAKEL), que induz o indivíduo ao coma por um período de
30 a 40 horas.
A Insulinoterapia é indicada para os indivíduos com tendência
regressiva, como os esquizofrênicos juvenis, e para quem tem resistência aos
psicofármacos.
O eletrochoque e o coma insulínico levam o paciente a uma
profunda regressão fisiológica e psicológica.
Conseqüentemente, as funções psíquicas superiores são “apagadas”,
permitindo, segundo seus adeptos, uma reconstrução sadia da estrutura
psicológica do paciente.
Outra opção de tratamento para os doentes mentais dentro do
modelo médico é a Lobotomia.
Criada por MONIZ apud SILVEIRA
(2001), em 1936, essa intervenção seccionava as fibras nervosas que ligam os
lóbulos frontais às partes subjacentes do cérebro. O objetivo é obter o alívio para os sintomas
mentais, principalmente, em pacientes que apresentam idéias fixas e
comportamentos repetitivos, como os esquizofrênicos agudos.
Porém, muitos dos tratamentos mencionados anteriormente,
normalmente, ainda são utilizados quando o doente é internado em um hospital
(eletrochoque, insulinoterapia).
Muitos psicóticos necessitam de internação em hospital
psiquiátrico, principalmente quando estão em surto.
DAMETTO (1981) propõe para os pacientes internados, algumas
práticas que os auxiliarão na melhoria do seu comportamento perturbado. É relevante a praxiterapia, visando facilitar
ao paciente uma ligação com a realidade e a conscientização de suas capacidades
e dificuldades reais. A organização de
grupos operativos no hospital, também é importante, com o objetivo de se
trabalhar com os problemas apresentados por qualquer membro participante,
propiciando aos pacientes opinarem com relação à rotina hospitalar.
Outra terapia realizada, freqüentemente com psicóticos,
internados ou não, é a Psicoterapia que tem por objetivo:
“... reequipar o paciente para que ele possa retomar sua vida,
juntar tudo o que tem de sadio”. (DAMETTO, 1981, p. 75)
No decorrer do processo terapêutico, DAMETTO (1981), sugere
verificar, não os sintomas, mas, sim a capacidade de o doente conviver com os
seus familiares, consigo mesmo e com suas tarefas.
Porém, a atitude interna do terapeuta é relevante, pois:
“...o terapeuta, tendo como principal instrumento de trabalho,
sua personalidade, tem tais ou quais reações frente ao doente, baseadas em suas
próprias vivências internas....
Infelizmente, os psiquiatras ... estão impregnados de idéias
preconcebidas. Há muitos rótulos para as
doenças e pouca visão para o doente”. (DAMETTO, 1981, p. 55).
Este fator impossibilita, freqüentemente, o tratamento
psicoterápico de obter resultados promissores.
É relevante na Psicoterapia
trabalhar a parte sadia do paciente e esquecer a doente.
As psicoterapias podem ser:
}
individual;
}
em grupo,
}
ou familiar.
A diretriz da Psicoterapia será de acordo com a abordagem
adotada pelo psicoterapeuta:
}
psicanálise;
}
junguiana;
}
comportamental;
}
centrada no cliente;
}
gestalt
e,
}
outras.
Existe uma crítica acentuada à visão organicista da doença
mental, como também, da sua forma de classificação, dos sintomas e dos
tratamentos defendidos pela Psiquiatria tradicional.
Divergindo a Psiquiatria, a Antipsiquiatria alega que
“...a patologia mental exige métodos de análise diferentes
daqueles da patologia orgânica”. (FOUCAULT, 1968, p. 17)
A Antipsiquiatria vê a Doença Mental como um sintoma de uma
crise microssocial:
“...constitui um modo mais ou menos característico do
comportamento grupal perturbado, não existe esquizofrênico”. (COOPER, 1973, p.
47)
Para a Antipsiquiatria, a causa da origem da Doença Mental é a
ditadura familiar a qual o indivíduo está submetido, normalmente assumindo um
falso “eu”, visando satisfazer o grupo social.
A negação da autenticidade gera um constante conflito. A não concretização da verdadeira identidade
torna o indivíduo confuso e contraditório, manifestando sintomas. Os atos contraditórios são o reflexo das
contradições do grupo, pois a família, freqüentemente caracteriza-se por duplo
vínculo.
Segundo a Antipsiquiatria, os sintomas são formados de protestos confusos. É a negação do que o nega como ser humano
autêntico. Apresentando comportamentos
que fogem dos padrões normais, o indivíduo é “etiquetado” e excluído da
sociedade contraditória.
Partindo dessa premissa, a antipsiquiatria esquematizou um
tratamento, visando permitir ao psicótico realizar a sua “viagem através da
loucura”, que é o caminho utilizado pelo doente mental na busca da sua
verdadeira identidade, que foi negada pelo grupo social. Há uma desestruturação dos esquemas alienados
da vida cotidiana para reestruturar em bases sólidas e pela vivência do próprio
indivíduo.
Alguns antipsiquiatras realizaram algumas reestruturações nos
hospitais psiquiátricos e mudanças no tipo de tratamento ao doente mental.
Na Itália, BASAGLIA (1985) extinguiu, gradativamente os setores
fechados do hospital Gorizia e com os mecanismos tradicionais de controle a
partir de 1961. Modificou o processo de
admissão do paciente e a sua estada dentro do hospital.
Em Londres, LAING apud
DUARTE (1986) elaborou centros alternativos, onde a vida comunitária era
livre. Pacientes e enfermeiros
participavam ativamente da comunidade.
Propiciou ao paciente, um espaço onde ele podia chegar tranqüilamente ao
limite de seus delírios, realizando sua “viagem mental”, sem intervenções
físicas ou químicas.
Em janeiro de 1962, COOPER apud
DUARTE (1986) organizou a “Vila 21”, na Inglaterra. A vila possuía, pacientes, diagnosticados
como esquizofrênicos. Não eram
invalidados ou isolados quando do seu ingresso à Vila 21. Eliminou-se a hierarquização formal e
extinguiu-se, parcialmente, a distância entre pacientes e funcionários.
MOFFAT, 1984, adaptou a Antipsiquiatria à realidade da
Argentina, na comunidade popular de Penã.
Aí, foram criados eventos que visavam extinguir a ociosidade dos
pacientes, que readquiriram gradativamente a noção do tempo.
As diversas alternativas de tratamento ao doente mental são questionadas e modificadas
constantemente, porém de forma isolada.
Deve-se verificar qual o melhor caminho para se atingir resultados
significativos no tratamento.
É relevante conhecer as várias abordagens referentes à origem e
o tipo de tratamento psicótico, possibilitando a ampliação de opções na escolha
do tratamento a ser realizado com o paciente.