sexta-feira, 14 de agosto de 2015

VISÃO PSICANALISTA DA DOENÇA MENTAL













No final do século XIX procurou-se distinguir a neurose de psicose.  Em uma carta de FREUD para FLIESS ocorre a distinção bem clara entre o termo neurose e psicose.
Em seus primeiros escritos FREUD tentou identificar os mecanismos que operam na relação do sujeito com o exterior e relacionar o conflito defensivo contra a sexualidade em determinadas psicoses.
Em 1911 e 1914, FREUD enfocou a psicose a partir da relação entre os investimentos libidinais e os investimentos das pulsões do ego, no objeto.
Na segunda teoria do aparelho psíquico Freud afirmou que na psicose ocorre a ruptura do ego[1] e a realidade, e o ego fica sob o domínio do id[2].  Os delírios na psicose são os desejos do id, e todas as pulsões se acham agrupadas num mesmo pólo do conflito defensivo (o id).
Na última fase da obra de FREUD, propõe-se a psicose como uma busca de um mecanismo, inteiramente original de rejeição da realidade.   É a retração da libido que abandona os objetos  e volta-se para o ego.   É o conflito entre o ego e a realidade, é uma defesa contra a frustração e idéias intoleráveis, segundo os psicanalistas.
Porém, FREUD excluiu o tratamento analítico para a psicose, alegando a dificuldade do psicótico em estabelecer  a transferência necessária para o analista.
FREUD, em abril de 1928, mencionou ao psicanalista húngaro HOLLÓI apud GAY (1989) a sua resistência a tratar psicóticos: 
“Finalmente confessei a mim mesmo que não gosto dessas pessoas doentes, que me zango com elas por senti-las tão distante de mim e de tudo o que é humano”. (GAY, 1989, p. 488)

Foram analistas subseqüentes que efetivamente realizaram um trabalho terapêutico com os psicóticos, reelaborando e revendo algumas das teorias de FREUD.
Alguns psicanalistas que realizaram trabalhos com psicóticos foram:
}              Paul Federn (1934), defendeu que os pacientes psicóticos capazes de realizar a transferência, podiam ser tratados pela psicanálise.
}              Harry Stack Sullivan apud FINE (1981) foi o primeiro analista a comunicar resultados bem-sucedidos no tratamento.  Afirmou que o psicótico deve ser despido da implicação de cronicidade e deterioração inevitável.
}              Melaine Klein apud FINE (1981) não diferenciou agudamente o neurótico e o psicótico.  Considerou que todos os indivíduos passam por fases paranóides e depressivas na infância,  e que estas fases ficaram marcadas em graus diferentes e são suscetíveis de tratamento.

Alguns sintomas manifestados pelo psicótico, segundo a psicanálise, são:
}              a dificuldade do ego em lidar com os conflitos;
}              ansiedade, pânico e mecanismo de defesa;
}              regressão oral;
}              hostilidade mais forte que a sexualidade;
}              mãe esquizofrênica.  A mãe do psicótico contribui para que o filho fuja para o mundo da psicose com a finalidade de encontrar a paz;
}              profundo egocentrismo dos pais, eles são os precursores da regressão cognitiva do paciente, e
}              sintomas alucinatórios e ilusórios são tentativas de restauração e reestruturação psíquica.

Para Psicanálise, os sintomas são o reflexo de algum processo subjacente.  O tratamento proposto  pela psicanálise é o da Psicoterapia.  Segundo FEDERN apud FINE (1981), os pacientes psicóticos que são capazes de realizar a transferência são acessíveis à Psicanálise.  É relevante que uma parte do ego do psicótico perceba seu estado anormal, e ele esteja dirigido para a realidade.  Deve-se precaver na análise de um psicótico não aumentar a regressão de seu estado.
O tratamento psicanalítico realizado por FEDERN apud FINE (1981), visa o estabelecimento de transferência positiva e a interrupção da transferência negativa.
Entende-se por transferência na psicanálise:
“...o processo pelo qual os desejos inconscientes se atualizam sobre determinados objetos no quadro de um certo tipo de relação estabelecida com eles e, eminentemente, no quadro da relação analítica.
Trata-se de uma repetição de protótipos infantis vivida com um sentimento de atualidade acentuada”. (LAPLANCHE, 1992, p. 14)

Na Psicoterapia Psicanalítica individual, o paciente, através da associação livre, expõe lembranças, emocionalmente, carregadas de acontecimentos da infância, supostamente, subjacentes à perturbação atual.  Através da associação livre, pretende-se permitir que ocorra insight das origens dos conflitos.
Um dos tratamentos conhecidos realizados pela Psicanálise foi o Caso Schreber (1911), desenvolvido por FREUD.   Outro foi realizado por GREEN apud FINE (1981), que posteriormente relatou no seu livro “Nunca lhe prometi um jardim de rosas”.
SULLIVAN apud FINE (1981), também realizou tratamentos que tiveram resultados bem-sucedidos.
A Psicoterapia pode, também, ser realizada em grupo.    A terapia grupal é uma praxe no tratamento hospitalar.
A Terapia Familiar é o tratamento das pessoas da família como um grupo.  A família é uma das responsáveis pela criação e manutenção do comportamento perturbado do indivíduo, sendo relevante um trabalho realizado, diretamente com ela.
A crítica existente do modelo médico à Psicanálise refere-se ao tratamento psicoterápico para psicótico, visto que o objetivo da análise é tornar o inconsciente do indivíduo consciente. No entanto, o psicótico já tem seu inconsciente à mostra, conseqüentemente ele necessita é da repressão desses conteúdos.
Outro aspecto é que o paciente psicótico não consegue simbolizar para os psicanalistas.  Não simbolizando, o paciente não realiza a transferência com seu terapeuta, que é um fator fundamental para o sucesso da análise.
Outra problemática é que para a Psicanálise, os símbolos que se apresentam na idéias delirantes dos pacientes psicóticos são como disfarce de tendências e desejos inconscientes, e com motivos de natureza sexual.
A imagem para Psicologia Freudiana está no plano secundário e que deveriam, segundo WIART apud  (SILVEIRA, 2001), ser transposto em palavras.
Para a Psicanálise a palavra é o único meio de comunicação que possibilita elaborar os conteúdos inconscientes, e realizar o processo de “cura”.   A interação entre o terapeuta e o paciente é apenas verbal e os conteúdos expressos através de expressão plástica devem ser interpretados, verbalmente.   Como o paciente em surto psicótico tem dificuldade de verbalizar, fica limitada a atuação do terapeuta psicanalista nestes casos.
FREUD dizia que:
“... para o psicótico, a psicanálise não era o método mais adequado.  As pessoas teimam em usá-lo em detrimento do paciente, que é envolvido nas mais grosseiras contradições que se possa imaginar, em função desta confusão”.  (DAMETTO, 1981, p. 70)
Enfim, para FREUD, como é inviável estabelecer transferência nas denominadas neuroses narcisistas (esquizofrenias, paranóia e melancolia), seria pouco provável viabilizar uma Terapia Psicanalítica.
Apenas na década de 30 alguns pioneiros tentaram realizar um tratamento psicanalítico dos psicóticos.




[1] ego – para psicanálise, instância psíquica que surge como fator de ligação dos processos psíquicos.
[2] id – constitui o pólo pulsional da personalidade, segundo a psicanálise.